Reset Emocional: A Descrição Dos Últimos Dias!
É verdade que a doença da minha mãe me deixou muito abalada, pela seriedade com que é preciso encarar, pelo timing – soube precisamente duas semanas após nos termos instalado em Bruxelas – pela ligação afectiva e emocional que temos, eu com ela, mas também ela comigo. E a verdade é que os dias nunca mais foram os mesmos, nunca mais consegui desfrutar das coisas e dos momentos genuinamente, ou melhor, se era um bom dia para ela, então, era um bom dia para mim e vice-versa. Ser racional tem sido o meu trabalho diário, mas somos seres humanos feitos de emoções, não é verdade?
Contudo, as últimas três, agora quatro talvez, semanas foram de uma intensidade tal que só o facto do meu corpo estar dorido e pesado, reflecte esse peso gigante que temos carregado da angústia, do medo, da impotência e do sofrimento no sentido mais literal da palavra. E tanto assim foi que viajei sozinha de urgência para Portugal para estar junto dela. Tinha-se dado uma reviravolta na sua caminhada, o seu corpo começou a não aguentar mais e foi quando vi a morte diante dos meus olhos da forma mais fria e mais cruel que eu poderia imaginar. A minha mãe, os outros doentes, um piso completamente cheio e, nesse momento, não dá para sermos egoístas e pensarmos “porquê nós?!”, “porquê a minha mãe?!”.
Aguentamos conformo podíamos, pois ninguém tem preparação para lidar com o que uma doença como o cancro nos impõe, mais cedo ou mais tarde. E eu sem saber o que verbalizar ou sequer responder às mensagens ou aos telefonemas, deixei-me ficar no meu canto para me permitir sentir tudo aquilo, aceitar e interiorizar todas aquelas emoções.
“Preocupamo-nos muito com o intelecto e menos com as emoções”, li numa entrevista, e não podia estar mais de acordo. Se me perguntam como estou, a reposta é simples: estou mal! Se me perguntam pelo estado de saúde da minha mãe, a resposta é tão simples, quanto dura: é um dia de cada vez! E basicamente é isto, numa oscilação constante entre os picos de esperança quando há um momento bom para, imediatamente a seguir, sentir que estamos a cair a pique num abismo.
E, afinal, como posso ter eu respostas para os outros se nem para mim mesma as consigo encontrar?! Talvez isto explique, em parte, o aumento da ansiedade nas pessoas da nossa geração. Esta pressa em atender os outros sem dar espaço para que o individuo se sinta a si mesmo.
Entretanto, o regresso a Bruxelas, passados cinco dias, foi igualmente em silêncio, mas não num vazio emocional, num processo de reset! Depois de ter vivido aqueles dias de forma tão intensa e de regressar sem certezas de nada, apenas com fé e esperança, a única forma de dar a volta e conseguir abraçar a minha família e a minha vida, é, sem dúvida, encher-me de amor!
E daqui saltei para um outro patamar, aquele em que dou por mim a olhar à minha volta e observar se eu mesma estou a emitir estas vibrações de amor no sentido mais acertado. Se as pessoas que estão à minha volta e próximas de mim são aquelas capazes de me preencher com esse amor, se eu mesma me sinto realizada ao ponto de conseguir entregar (e receber) amor de tudo o que faço, se as relações que estabeleço são equilibradas e de reciprocidade… é urgente rever tudo isto, mudar se for necessário, porque permitir-me sentir é a melhor forma de dar a volta a isto.
Aposto que já ouviram falar e leram artigos sobre as pessoas e as relações tóxicas, verdade? Mas já se permitiram analisar a vossa vida a este nível? Já pensaram nos momentos em que dispõem do vosso tempo e energia para algo do qual não retiram nada de nada? Já deram por vocês a sentir o tal vazio emocional?
E das relações interpessoais, passamos rapidamente para as redes sociais, pois consomem grande parte do nosso tempo diariamente. Com o passar do tempo, percebi que não sou o tipo de pessoa que tem curiosidade pela vida alheia, que se aborrece de ver sempre as mesmas coisas (e, por isso, vou deixando de fazer coisas em massa), que preciso mais do que ver cremes, roupas, no fundo COISAS sempre que abro o Instagram. Ou simplesmente, neste momento, em que preciso de me repor emocionalmente, não retiro sequer inspiração das redes sociais, com prejuízo para o meu trabalho.
Ainda assim, o permitir-me sentir, permitir-me aceitar e, se tudo isto que estou a viver, me levará para uma nova - e até inesperada - mudança, eu estarei de braços abertos para a receber, seja ela de que natureza for. O medo destes momentos cruciais continua, o que mudou é a forma como lido com ele.
Permitir-me o silêncio nestes dias tem sido terapêutico, pelo menos, a minha impulsividade que brotava sempre nos momentos de tensão está sossegada. Era importante esvaziar os estímulos para conseguir perceber exactamente de onde vem aquilo que eu realmente estou a procura e que me preenche não apenas hoje, mas nesta nova fase de mim!
E, no fundo, estes últimos dias é como se tivesse voltado atrás no tempo, aquele tempo em que vivíamos simplesmente para nós, sem pressas e sem pressões sociais e a conclusão a que chego é que é bom sentir esse liberdade de apenas "ser", ser mais inteiro e mais autêntico, esquecendo que vivemos todos em rede e numa ânsia de partilha.