O momento, pelo qual todos perguntavam, chegou. E agora?
As mães são umas lameches e não devem pedir desculpa por isso. São umas lamechas porque durante nove meses geraram uma vida dentro de si, alimentaram e preocuparam-se com mil e umas coisas (consigo e com o seu corpo) para que aquele bebé viesse saudável. A seguir, acontece um turbilhão de sentimentos. Voltamos a ser apenas nós, o bebé passa a ser de tantas outras pessoas, mas a responsabilidade parece que permanece essencialmente na mãe. Aos poucos, o instinto de leoa vai abrandado e vamos conseguindo gerir melhor o crescimento e o desprendimento físico do bebé. Naturalmente, estou a falar de coisas que podem ser mais fáceis de lidar para umas e menos para outras.
Com o Vicente foi bastante difícil, o parto tinha sido complicado, a amamentação também não correu bem, não queria que se usurpassem do meu bebé. É estranho, mas acredito que a experiência do parto tenha tido bastante influência, para além de primeiro filho. Com a Laura foi tudo diferente, era a segunda, mas sobretudo, tinha sido O parto da minha vida, tal e qual eu imaginava – se é que isso é possível.
Mas, no entretanto, passaram-se cinco anos e meio da minha vida em que tive a maternidade como o principal foco. Fiz tudo com os meus filhos, tive aventuras e desventuras, mas eles estavam sempre lá e eu também estive, todos os dias, em todos os momentos – salvo as raras vezes em que me ausentei sem filhos.
Com o Vicente foram dois anos sem me separar um único dia dele, sem o partilhar com mais ninguém. Brincamos, choramos, dormimos, passeamos… fizemos tanta coisa em conjunto que, a primeira vez, que andei sem carrinho de bebé ou sem bebé ao colo, foi uma sensação muito, muito estranha. Tinha desaprendido o que fazer com as mãos.
Quando recomecei a trabalhar, era um regime diferente, em casa e eu fazia os meus horários. Não raras vezes, trabalhei madrugadas dentro porque os tinha a eles e não conseguia conciliar. Ao final, de cinco anos e meio, eles são o “background” e a minha referência, por vezes, acontecia não saber estar com só adultos e ser preciso tempo para desenferrujar as conversas.
O meu percurso com - e após - a maternidade não terá sido nem mais fácil nem mais difícil do que o vosso. Tem as suas próprias características, foi muito intenso, foi muito profundo. Transformou-me, sem dúvida, numa pessoa diferente (da qual eu gosto mais também). Com isto tudo, não foi fácil conciliar o eu, mas nunca tive receio de como seria a minha vida após os filhos – tipo, neste preciso momento, em que estão os dois na escola. Não senti que deixei de ser menos “válida” na sociedade ou uma pessoa menos interessante. Aliás, acho que o facto de lidar com crianças me ensinou muito, sobretudo a voltar a ter um pouco da simplicidade que as caracteriza e a ser menos pessimista e menos conflituosa dos que os adultos em que nos tornamos. (Re) Aprendi a sorrir por nada, a agradecer as coisas simples da vida e descobri que, afinal, tudo o que eu preciso para ser feliz está à minha volta.
Contudo, o tal momento chegou. E não sei bem como explicar isto…, mas não existe uma continuidade do que era a minha vida antes – há muito deixou de haver, mas tinha a maternidade como “bengala”. Há uma fase nova, um recomeço e tenho um livro praticamente em branco diante de mim e isto não deixa de ser magnifico – com o tanto de assustador que possa ter, mas não é nisso que me quero focar.
Sei aquilo que eu gosto mais de fazer e é isto, estar aqui a escrever sobre sentimentos, sobre a vida, sobre a profundidade do ser humano, sei que ainda preciso de caminhar mais para ter a minha estabilidade, sei que não será fácil, todavia, acima de tudo, eu olho e vejo a beleza de poder escrever a minha história, com a vantagem de tudo o que já vivi e com tudo o que já aprendi.
E não, o desconhecido não é assustador. Nós é que construímos essa ideia e, por nossa própria culpa, deixamos progressivamente de arriscar, de sonhar e de correr atrás desses sonhos. Mas uma das coisas que eu quero ensinar aos meus filhos, desde cedo, é que sonhem muito, mas acima de tudo, que tenham a ousadia e que construam as ferramentas para correr atrás desses sonhos.
Hoje foi um dia estranho… porque as mães são pessoas lamechas, um dia que me fez reflectir na minha vida, em que me fez olhar bem para dentro e (tentar) descobrir os passos que se seguem. Aprendi tanto com os meus filhos que, respondendo há pergunta que mais me fizerem, eu não tenho medo da Vera que virá a seguir! A minha vida concentrou-se na maternidade, dei voltas e tomei decisões que só os filhos nos fazem ponderar e encontrei um lugar melhor para viver, uma pessoa melhor e um entendimento do mundo que está muito acima daquilo que nos impõe acreditar.
Hoje foi o primeiro dia da escola da Laura e o primeiro dia do resto da minha vida. Tenho 35 anos, um CV que pode deixar algumas pessoas confusas, porque nem sempre segui os meus sonhos, despedi-me de um emprego seguro e acredito que a vida não se resume a um só trabalho para a vida toda, que pode ter momentos de improviso, outros de autoconhecimento, de aventuras e, no final, de muitas descobertas e muitos encontros.
Foi um dia repleto de emoções, sentimentos, cheguei mesmo a fazer uma retrospectiva da minha vida, a ida para Bruxelas, o ser mãe a tempo inteiro, o regresso, as dúvidas…. Foi um dia que serviu de preparar a um setembro de acção e de novidades.
P.s: Sobre o balanço da entrada da Laura na creche falarei mais no final da semana, sim? Mas não, não houve choros no primeiro dia e isso mostrou a sua valentia e coragem! Mas cada dia é um dia e vou-lhe dar tempo para se habituar.