Duas Semanas Na Escola Primária E Uma "Espécie" De Carta Ao Filho Mais Velho
Querido Vicente, tu tiveste o privilégio de entrar mais tarde no infantário. Tinhas cerca de dois anos e meio quando te deixei pela primeira vez numa escola. Eu estava devidamente preparada para ser segura e assertiva, para não me demorar nas despedidas e repetir-te que viria buscar-te. Estava preparada, contudo aqueles momentos iniciais, entre a tua chegada e a minha partida, eram angustiantes e desconcertantes. Lembro-me que nos momentos a seguir ficava sempre um pouco desorientada – e, mais tarde, a história repetiu-se com a tua irmã.
Ainda assim, o problema não era estar, pois desde o primeiro dia que te adaptaste bem, não ficavas apático, triste ou introvertido. E a verdade é que nunca recebi uma chamada da parte tua escola para te ir buscar mais cedo.
Não esqueço, em particular, do primeiro dia de todos, com os teus braços enrolados no meu pescoço com uma força de gente crescida. Enquanto tentava separar-te de mim, repetia-te “a mamã ama-te e vem buscar-te!”. Repetia que o “vou buscar-te” mais do que uma vez, mas não me demorava nas despedidas - e este é o grande conselho que vos deixo, serem firmes e não frias, transmitir segurança sem deixar transparecer as nossas emoções, ou tentar.
A partir daqui, mudaste mais uma vez de escola e duas vezes de sala e nunca mais te vi chorar. Foste crescendo com os mesmos amigos, foste criando os teus próprios hábitos e o há vontade de quem vai passando para o grupo dos mais velhos. Voltar a tirar-te do teu mundo, custou-me muito e que nunca penses o contrário.
Hoje chegas ao fim da tua segunda semana na tua nova escola. Não tiveste problema em fazer amigos, não fizeste da barreira linguística um problema, estás entusiasmado com tudo o que estás a começar a aprender, adaptas-te à rotina com a tua turma e com a supervisão do teu professor, com quem simpatizaste. Mas voltaste a chorar e eu voltei a sentir aquele aperto no peito, porque mãe sofre porque mãe tem o coração fora do seu peito e, se pudesse, ela jamais colocaria o seu filho em situações que o pudessem fragilizar. Portanto, têm sido duas semanas intensas nas emoções, todas elas muito à flor da pele, as vossas que descarregam em mim e as minhas que descarrego… não sei bem onde.
Passaste de uma família-escola pequena para uma escola grande com demasiados alunos e alunos que váo desde o quatro anos até ao 12º ano. E embora esteja tudo organizado, a verdade é que é tudo demasiado grande para ti. Eu sei que subir as escadas da tua antiga escola sozinho em nada se compara ao facto de teres que te despedir de mim ao portão e seguir por um caminho que te parece demasiado longo para fazer sozinho. Eu sei e por mais que queira te proteger e que tente argumentar com os seguranças, eu não posso proteger-te para além daquele portão.
Sabia que este dia, numa escola grande, iria eventualmente chegar, mas não imaginava que fosse tão cedo, pois mesmo que sejas uma criança crescida, no meio de tudo aquilo, és ainda demasiado pequeno. São milhares de crianças a passar e tu a tentares manter o teu foco, lembrando-te das coisas que te ensinaram, do ponto de encontro, do que fazer e do que dizer.
Os olhos enchem-se de lágrimas sempre que estás na iminência de ter que fazer o teu caminho sozinho, que não encontras a vigilante ou algum colega. Agarras-te a mim e eu… eu, filho, encorajo-te a seguires em frente sozinho e que se olhares para trás, eu vou lá estar, mas que agora é altura de saíres do meu ninho.
Depois, a magia acontece e tu ficas bem, tens amigos e tens a tua zona segura e as rotinas orientadas e guiadas. Mas a separação custa e eu, ingenuamente, também achava que ir conseguir ter-te debaixo da minha asa por um pouco mais.
Foram duas semanas loucas em termos de emoções, tanto para ti, como para a tua irmã. Contudo, falo para ti, porque a entrada no primeiro ano tem uma simbologia especial, significa a tua entrada na grande escola. E agora, meu filho, tens uma vida pela frente, com oportunidades, valores, aprendizagens, superações e também decepções com as quais terás que lidar. E eu, como tua mãe, passo os dias a pensar em como lidar contigo a partir de agora, como há tantas coisas que eu te quero ensinar e ferramentas que vais precisar para essa pessoa adulta, ainda em formação, que serás.
Mas nunca penses que não me custa, porque custa. Porque ajudar um filho a crescer e entregá-lo ao mundo, custa. É como se tivéssemos que arrancar uma parte de nós, do nosso corpo da qual precisamos para viver. Agora vou aprender também eu a ser mãe de um menino crescido, vou aprender a sossegar o meu coração porque tu estás a fazer o teu caminho e é assim que deve ser.
Se tu soubesses o orgulho que tenho em ti e na tua irmã… é imenso!