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As viagens dos Vs

Mulheres nutridas, famílias felizes

As viagens dos Vs

A entrevista na creche e o turbilhão de sentimentos

06.07.18 | Vera Dias Pinheiro

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No meu caso, a entrada na creche acaba por ser uma consequência natural e não uma necessidade, por assim dizer. Aliás, o momento surge até mais por uma necessidade minha, caso contrário em vez de entrarem agora na creche, esperaria que completassem os três anos e, assim, iniciariam o Jardim de Infância directamente. E mesmo que, com o segundo filho, esse “prazo” seja idêntico, confesso que os motivos, ainda assim, são um pouco diferentes.

Quando o Vicente iniciou a creche foi, acima de tudo, um motivo pessoal meu, pela minha necessidade em voltar a ter o meu espaço, a minha liberdade. No fundo, poder voltar a dedicar-me a coisas de adultos e não apenas ao universo de uma criança. Nunca achei, todavia, que o Vicente tivesse problemas de socialização, felizmente isso sempre foi uma prioridade minha e do meu marido. Desde bebé que lhe proporcionamos muitas coisas diferentes, que privou com crianças e que teve rotinas - hei!!!! Eu sou a mãe das rotinas, deixei de ser general com o segundo filho, mas só isso. Era eu que tinha atingido o limite da minha capacidade de entrega total e absoluta, precisava de oxigénio para continuar a desempenhar este papel (o de mãe) tão bem como até ali.

Com o segundo filho, toda a conjuntura é diferente. O ambiente de casa, as rotinas e a própria presença de um irmão mais velho vêm acelerar por completo a forma como aquela criança se desenvolve. Desde cedo percebi que a Laura nunca iria brincar com os brinquedos por fases de idade, tal como fui fazendo com o Vicente. Ela atirou-se logo aos brinquedos do irmão e, à medida que foi crescendo, as brincadeiras são a dois e não apenas sozinhos. A vontade do mais pequeno de se igualar ao mais velho é gigante, portanto a sensação com que fico é que a Laura deixou de ser bebé e passou imediatamente passou a ser uma criança crescida. E isso aconteceu logo após o primeiro aniversário.

Tanto assim é que, neste momento, sinto que vou deixar na creche uma menina muito mais crescida do que era o irmão. Muito mais consciente de tudo, muito mais capaz de perceber esta mudança e, sem dúvida, muito mais ávida por esta mudança. Atenção, que nada disto invalida que, chegada a hora de ficar na creche, ela chore, não queira ficar, etc... Mas, tal como o irmão, vai passar e tenho a certeza que vai passar assim que eu virar costas. E eu sei que me vai saber bem voltar para casa e ter o meu silêncio de volta, não dividir as minhas horas de trabalho com mais nada e conseguir despachar todas as minhas tarefas extra mãe até ao momento de os ir buscar à escola.

Sei igualmente que irei voltar a ter mais energia para as idas ao parque ao final do dia, para as brincadeiras e para eles nessa altura. Neste momento, e com prejuízo para o Vicente muitas vezes, já chego cansada ao fim do dia, muito dispersa por ter que estar constantemente a conciliar coisas em paralelo. Às vezes, isso faz-me perder o foco e a motivação em geral.

Porém, sei de antemão, que, a partir do primeiro dia em que lá ficar, a minha pequenina irá crescer ainda mais rapidamente. Irá, tal como o irmão, iniciar o seu percurso na escola, na socialização com os pares, na criação de laços fortes extra família e, ao mesmo tempo, lidar com mais frustrações e ser obrigada a sentir-se contrariada. Mas consciente dessa "separação" e do seu impacto, sinto-me mais ligada a ela por estes dias, como se estivesse a aproveitar todos os segundos em que é apenas minha.

Não sinto que vá ficar com um vazio e não me questiono de como serão os meus dias a partir de setembro. Os meus dias já têm rotinas e responsabilidades, tenho uma ocupação e compromissos a cumprir. Contudo, a oportunidade de ser uma mãe que vive diariamente para os seus filhos e que organiza toda a sua vida, para além da maternidade, em função deles, sente uma nostalgia. Foram dois anos com cada um deles, fui uma presença constante na vida deles, de dia e de noite, foi não faltar um único momento das suas vidas, desde o dia em que nasceram. Mais tarde, foi repartir essa experiência com mais um filho, foi saber que a minha escolha exigia que, independentemente de qualquer coisa, eles seriam a prioridade e que, alguém a ter que ceder, esse alguém seria eu.

Não me tornei dependente dos meus filhos, senti sempre a necessidade de tentar manter o equilíbrio com a minha pessoa para além deles. Fiz um esforço por conciliar tudo e fazer deles a melhor companhia para tudo. Mas irei olhar para trás e pensar sempre que fiz a escolha certa, por eles e por mim. Tudo o que vier a partir daqui virá no momento certo para todos. A aceitação será natural e compreendida, ao mesmo tempo que sentimos essa vontade de passar à etapa seguinte.

Nunca me irei esquecer do meu primeiro dia em Bruxelas. Eu, o Vicente, o meu marido a trabalhar e um mundo totalmente desconhecido para nós lá fora. As primeiras idas ao médico, sentindo que não estava capaz de me expressar e de ser a mãe, as dificuldades em encontrar-me e fazê-lo (a ele) sentir-se confortável e seguro naquela mudança. Desbravámos o desconhecido em conjunto, aos poucos criamos rotinas, conhecemos pessoas e tínhamos os nossos sítios preferidos. O Vicente mostrou-me o que de mais profundo existe dentro de mim, ensinou-me a ser mais paciente, mais abnegada, mais desprendida daquilo que é acessório e sem grande tempo para perder com coisas que não acrescentam nada de importante à minha/nossa vida. Voltei a ser mãe e a voltei a sentir que tinha tudo para reaprender novamente. Voltei a ter medos, chorei, mas tive sempre mais certezas do que dúvidas. Tinha a certeza de que tinha feito a escolha certa, mesmo que o futuro continue a ser sempre uma incógnita.

  


A mochila da Laura veio do site do Sítio do Bebé e pedi para personalizar com o nome dela.

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