Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

As viagens dos Vs

Mulheres nutridas, famílias felizes

As viagens dos Vs

Violência Doméstica: O Que Falha? | Testemunhos Reais #7

13.11.19 | Vera Dias Pinheiro

violence-against-women

 

Muito se tem falado sobre os crimes de violência doméstica: o que se deve fazer, como e a quem denunciar os casos, bem como o apoio que deve ser dado às vítimas deste crime público.

Parece, à partida, que tudo é muito fácil e acessível a quem passa por uma situação destas, mas a realidade é bem diferente.

 

Enquanto vítima de violência doméstica, e na qualidade de cidadã bastante informada, posso falar na primeira pessoa de que existem muitas falhas no que respeita ao apoio prestado às vítimas, começando, por exemplo, pelas próprias autoridades, associações de apoio à vítima e, por último, na justiça. É que existem ideias preconcebidas de que as vítimas de violência doméstica pertencem, sobretudo, a estratos sociais mais baixos desvalorizando por completo o testemunho e os relatos de vítimas que não se enquadram naquela “classe”.

 

De uma forma geral, posso garantir que os agentes das forças segurança de uma esquadra não estão preparados para atender um telefonema de uma pessoa em apuros. Das várias vezes em que liguei para a PSP, quando senti que a minha vida estava em risco estando eu na minha própria casa, trancada num quarto a relatar o que estava a acontecer a resposta foi a seguinte: “tenha calma, onde é que a senhora está? Está alguém consigo?” e repetem estas questões vezes sem fim enquanto eu apenas pedia por ajuda. Bem sei que existem muitos telefonemas falsos, mas tendo em conta que uma pessoa assim que liga logo se apresenta com nome, morada e relata a situação, bem que os senhores agentes podiam passar para o ponto seguinte. Quando questionava se me podiam ajudar voltavam a perguntar: “onde é que a senhora está? E está alguém consigo?”. Lá voltava a repetir tudo e pedia por tudo que me ajudassem. A resposta era esta: “o carro patrulha agora não está nessa zona e não temos ninguém para ir aí agora, mas ligamos mais tarde para saber como está?”. Tive a sorte (?) de o agressor ter fugido da minha casa quando percebeu que eu tinha ligado para a polícia. Nas outras vezes, em que era vítima de assédio (perseguição) e ficava encurralada na minha própria casa respondiam: “não abra a porta”. Ao que eu respondia que não podia ficar ali o dia todo porque tinha que ir trabalhar.

 

O mesmo registo é seguido por várias das associações de apoio à vítima, que existem na nossa praça. O único apoio que tive foi por telefone e quando me desloquei, pessoalmente, a uma delegação de uma dessas associações e repeti a minha história, vezes sem conta, a resposta que tive foi a de que nada serviria fazer uma queixa na polícia, pois de nada valeria. Fazem-nos ainda um questionário muito simples e avaliam assim “do pé para a mão” de que o risco é mínimo. Como se o facto de ser vítima de agressões físicas, psicológicas e verbais, e o facto de estar grávida, viver sozinha e, por isso mesmo, estar a pedir ajuda não pesasse rigorosamente nada na balança.

 

Só após muita insistência da parte da vítima, familiares, amigos e testemunhas, é que se poderá vislumbrar uma luz muito ténue ao fundo do túnel. Aí eu questiono: então e as mulheres que não têm este apoio, esta rede de apoio próxima ou facilidade económica e financeira o que fazem? 

 

Os números que vemos nos media são assustadores. Em 2019 já contamos com 30 vítimas mortais, incluindo crianças. Mas não são números que temos que combater. São pessoas que temos de proteger, de cuidar, de salvar. Falta o quê, então? O que podemos fazer? Gritamos por justiça, mas ela não nos ouve! Faltam redes de apoio? Talvez. Falta formação aos agentes e às autoridades? Falta! Faltam leis? Talvez não, mas falta formação aos magistrados, que muitas vezes aplicam leis baseados nas suas convicções e crenças pessoais.

 

É preciso ouvir as testemunhas e não descredibilizá-las! Precisamos de magistrados conscientes e capazes de se colocarem na pele das vítimas e tentarem perceber o flagelo pelo qual passaram sem olhar apenas a provas e a factos. Porque uma coisa é certa: o crime da violência doméstica acontece, sobretudo, dentro de quatro paredes, onde normalmente estão apenas a vítima (ou vítimas se existirem filhos presentes) e o agressor. Certo é, que a vizinhança, os familiares e os amigos poderão testemunhar algo suspeito, mas nunca poderão ser precisos, pois não estavam no local do crime. Sendo assim, não basta pedir bom senso. É preciso praticá-lo. É urgente agir com precisão e celeridade e impedir que este número, tão assustador, continue a aumentar, como se de feijões se tratasse.

 

                                                                                                                                                                                          {Obrigada}

 

 

Outros Testemunhos:

#1 "Mãe, porque é que eu sou gorda?

#2 Cancro: "A mãe está doente!"

#3 No Papel Da Madrasta

#4 A Minha Experiência Num Retiro Espiritual

#5 Quando O Cancro Bate À Nossa Porta

#6 Conviver Com Uma Doença Inflamatória Do Intestino

 

Se tiver uma história que queira partilhar comigo e neste espaço,

escreva-me através do seguinte endereço de e-mail

 blogasviagensdosvs@gmaill.com

UA-69820263-1